Não raras vezes tenho a sensação de que minhas leituras (por mais diversificadas e aleatórias que pareçam ser) convergem para o momento que estou vivendo, são dadas a mim como reflexões pertinentes e necessárias para a fase que vivo. Assim, experimento as descobertas de três textos recentes, cada um entregue por mãos amigas (e ler livros e revistas de empréstimo tem seu encanto particular, pois a leitura vem com a carga afetiva, a temperatura de quem emprestou...). O primeiro é um livrinho encantador, que conheci graças ao Sérgio: O flâneur, do Edmund White, fez-me passear por Paris sem nunca ter ido lá - e, de quebra, refleti sobre questões sociais e, claro, comportamentos de flânerie, que eu gostaria de assumir muito mais. O segundo, um livro de contos do Harold Brodkey, chegou a mim por causa do Pedro. Mal iniciei Quatro histórias ao modo quase clássico, mas já me veio a vontade de eleger uma citação:
"Desconfio de resumos, toda sorte de deslize no tempo, qualquer exagerada pretensão de controle sobre o que se conta. Penso que todo aquele que declara entendimento mas está calmo, que pretende escrever com emoções relembradas na tranquilidade é um tolo mentiroso. Entender é tremer. Relembrar é readentrar e clivar. Um acrobata, após zombeteiramente saracotear no espaço, equilibra-se no pouso e agradece ao público como se a razão pela qual lhe aplaudem fosse algo fácil para ele e não lhe custasse vintém, embora, no entanto, ele esteja coberto de suor e seu sorriso seja marcado por um alívio que causa aflição; ele se dá ao luxo estilo show-business, finge ser sobre-humano. Estou farto disso e de até onde isso nos levou. Admiro a autoridade de se postar de joelhos diante do evento." (p.11)
A terceira leitura é a dos artigos da revista Serrote, que conheci através da Regina. O número 4 traz, dentre vários assuntos ótimos, um estudo do Terry Eagleton intitulado "Fé e razão". É daqui que retiro a passagem abaixo:
"(...) podemos sempre nos perguntar por que descobrir a verdade deve ser considerado tão desejável. Nietzsche certamente não pensava assim, e tanto Henrik Ibsen quanto Joseph Conrad tinham suas dúvidas quanto a isso. Nietzsche poderia perguntar: que rancor, que maldade, que ansiedade e que vontade de dominar espreitam por trás desse desejo obstinado de verdade?" (p.120)
Talvez seja muito sutil, para quem está de fora, a relação entre estas leituras e o efeito dos trechos citados sobre mim - mas não me cabe explicar isso, até porque seria demorado e não traria proveito a ninguém. É uma relação tão íntima e significativa, que o mais correto parece respeitá-la e reconhecê-la, sem descrições minuciosas que pudessem exauri-la. Paro e observo as ligaduras entre os textos e a vida: é coisa curiosa de se contemplar. E me dá prazer imaginar o que vem pela frente... O próximo livro, que o Renato me emprestou, é uma reportagem sobre Hiroxima. Será mais um elo para este momento? E de que maneira?
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