LIVROS E BICHOS

Este é o blog da Tércia Montenegro, dedicado preferencialmente a livros e bichos - mas o internauta munido de paciência também encontrará outros assuntos.

sábado, 16 de outubro de 2010

Le jour e la nuit. Cahiers 1917-1952


Da revista Serrote n° 5, destaco a matéria com os aforismos de Georges Braque - artista que, para mim, funciona como uma madeleine: viajo no tempo e volto às aulas de francês. Mas naquela época eu ainda não divisava o pensamento deste autor, nem suspeitava que suas reflexões fossem tão precisas. Identifiquei-me de imediato com algumas delas, que reproduzo abaixo:

Jamais teremos repouso. O presente é perpétuo.

A emoção não se deixa aprimorar nem imitar: ela é o germe, a obra é a eclosão.

Na arte, não se cria efeito sem retorcer a verdade.

Não faço como quero, faço como posso.

Contentemo-nos com fazer pensar, não tentemos convencer.

A arte é feita para perturbar, a Ciência tranquiliza.

Não se deve imitar o que se quer criar.

Na arte, só vale uma coisa: o que não se pode explicar.

Os que vão à frente dão as costas aos seguidores. É tudo o que os seguidores merecem.

Amo a regra que corrige a emoção. Amo a emoção que corrige a regra.

Definir uma coisa é substituir a coisa pela definição.

As ideias, como as roupas, se gastam e se deformam pelo uso.

Não se pode ficar o tempo todo com o chapéu na mao, por isso inventaram o cabideiro. Quanto a mim, encontrei a pintura para pendurar minhas ideias num prego.

Manter a cabeça livre: estar presente.

Minha tese se sustenta? É porque você a apoia.

A verdade existe; só se inventa a mentira.

O idealismo é uma forma convencional de esperança.

A forma e a cor não se confundem; são simultâneas.

O quadro está terminado quando se apagou a ideia.

Poucas pessoas podem dizer de si mesmas: estou aqui. Elas se buscam no passado e se veem no futuro.

A liberdade pode ser tomada, mas não dada. Para o comum dos homens, a liberdade é o livre exercício dos hábitos; para nós, é a transgressão do permitido. A liberdade não é acessível a todos, para muitos ela se situa entre a proibição e a permissão.

Entre os que praticam o culto de si mesmos, as convicções tomam o lugar da fé.

Em cada duas coisas que julgamos semelhantes, há sempre um sósia.

Não busco a definição. Tendo à infinição.

É o imprevisível que cria o acontecimento.

Uma coisa não pode estar em dois lugares ao mesmo tempo. Não é possível tê-la em mente e sob os olhos.

Há que se dar por satisfeito com descobrir, e cuidar de não explicar.

Traçam a rota rumo a um ponto, mas ignoram a deriva.

A realidade só se revela quando iluminada por um raio poético. Tudo é sono ao nosso redor.

Para mim, não se trata mais de metáfora, mas de metamorfose.

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