NÓS DOIS
Cruzei no parque com um amigo de infância. Desde nosso último encontro se haviam passado oitenta anos.
- Tens um aspecto estupendo! - exclamei ao vê-lo - Não mudaste nada.
- Não é verdade? Tenho que reconhecer que estou bem conservado. E tu?
"Melhor que tu, velho caduco" - pensei - "É difícil acreditar que temos a mesma idade. Eu continuo jovem, enquanto que a ti dá pena ver-te."
Em vez disso, respondi em voz alta:
- Pois estou ficando velho.
- Estou vendo; conta-me!
Sua alegria me roubou o desejo de continuar me fazendo de hipócrita. Ao fim e ao cabo, ele tinha de me pagar com a mesma moeda.
- Para quê? De toda forma, não acreditarias.
- Como não? Vamos, fale, que te escutarei com prazer.
"Mas que imbecil" - pensei - "No lugar de adivinhar que minto só por cortesia, levou os meus elogios a sério e ainda por cima exige que lhe explique minha suposta velhice, eu, que em comparação com ele estou feito um rapaz. Será que não se dá conta da diferença entre nós? Que imbecil e arrogante."
- Bom, parece que estou ficando um pouco ruim do ouvido.
- Que quer dizer "um pouco"?
- Quê? Fala mais alto, que não te ouço.
- Bem, está bem! - esfregou as mãos - E o que mais?
- Bom, creio que enxergo mal.
- Não me diga! Muito mal?
Seu entusiasmo não me agradou nada.
- Mas apenas às terças e sextas.
- Isso vai passar, já verás como vai passar e às terças e sextas também enxergarás pior. E o coração? E o fígado? Talvez uma ciática? Ou dor nos ossos? E o estôma...?
Aqui se interrompeu, porque lhe caiu uma perna. Eu me inclinei para pegá-la. Senti um rangido na coluna vertebral, mas o que não se faz por um amigo?
- É tua? - perguntei, estendendo-lhe a extremidade.
- Minha? Ah, sim, é possível, com efeito.
- Assim me pareceu.
- Às vezes ela cai, não tem importância.
- Pegue, pode ser útil.
Nesse momento me caiu o braço, o da mão com que segurava sua perna. Que má sorte que ocorresse isso justo naquela hora! É verdade que às vezes me acontecia, mas geralmente sem testemunhas.
Ajudando-nos mutuamente, colocamos nossas correspondentes extremidades e nos sentamos num banco próximo. Não sei por que, mas já não tínhamos vontade de falar. Contemplamos a distância.
Uma mosca pousou na minha calva; quis afugentá-la e me dei um chute na cabeça.
Isso queria dizer que agora tinha a sua perna no lugar do meu braço. Ao que parecia, nos tínhamos equivocado na montagem.
Quis dizer algo a respeito, mas ele havia adormecido. O sol da tarde esquentava agradavelmente, e a mim também pesaram os olhos.
"Eu lhe direi quando despertar".
E eu também dormi. Sonhei com nossa infância comum.
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